quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Super/Hiper (des)necessidades





Aaaaah, foram-se os tempos quando se ia ao empório secos e molhados* para comprar uma caixa de fósforos e voltava-se de lá apenas com a necessária caixinha. Talvez porque um balcão separava os clientes das mercadorias.


O tempo foi passando e alguém teve a brilhante ideia de tirar o balcão, permitindo que os próprios clientes escolhessem aquilo de que necessitavam. Eis aí a chave de tudo: necessidade!


Estava dona Mariquinha na venda para comprar a caixa de palitos de fósforo, mas, circulando pelas prateleiras, lembrou-se de que também precisava de açúcar, mais adiante... vejam só: batatas! Ela também precisava de batatas! Assim, uma caixa de fósforos ganha companhias.


Mais algumas décadas adiante, as ideias brilhantes foram ganhando ainda mais brilho. E assim surgiram os supermercados. Super! Amplos, diversos, esses estabelecimentos concentravam praticamente tudo que era necessário para manter uma casa: alimentos, produtos de limpeza e higiene pessoal. Claro que, com a diversidade de opções, a ida mensal ao super nunca mais se limitaria à caixa de fósforos (que, inclusive, nesse meio tempo, praticamente caiu em desuso!).


Ao longo dos anos, os superes (!) multiplicaram-se e já não ficavam mais tão longe de casa. Isso passou a viabilizar passadinhas mais frequentes que não apenas aquela mensal. Embora ainda houvesse a limitação financeira da esmagadora maioria (lá pelos anos 80, com inflação de 2000% ao ano!!**), quem resistiria àquele pacote de biscoito ou àquela lata de leite condensado (um luxo para época!) que não estavam na lista?


Fato é que os donos de super*** foram percebendo que o passeio pelas prateleiras suscitava ideias e desejos inconscientes. Assim, colocar as latas de massa de tomate ao lado das embalagens de macarrão era uma questão não apenas de praticidade, mas talvez houvesse a intenção de despertar na pessoa a vontade de comer macarronada, ainda que o intento original fosse apenas comprar um pacotinho de macarrão para deixar na despensa. Daí... já que vai fazer, faz direito: leva também o queijo ralado, a azeitona, o orégano e a carne moída pro bolonhesa! Assim, a compra de um item vira a de pelo menos seis!


Uma ideia boa dessas (para os donos de super, claro!) poderia ser aprimorada, pois não?! E foi. E como foi! O super cresceu e virou hiper! Versão master-blaster dos supermercados que contemplam tudo, tudo, absolutamente tudo que uma pessoa pode precisar (ou não) e imaginar! Além dos prosaicos alimentos, produtos de limpeza e higiene pessoal, num hiper você também encontra toda sorte de eletrodomésticos (incluindo itens de informática), além de livros, Cds, DVDs, móveis (incluindo os para jardim!), também todos os itens do vestuário, das roupas de baixo aos acessórios. Precisando de pneus novos para seu carro! Aproveite que vai comprar pão e compre também os pneus! Se quiser, também pode levar o óleo lubrificante (e o de cozinha!), o aromatizador e aquela chave de roda que anda precisando há tempos!


Um hiper torna praticamente impossível a compra de um único item! Se a passagem por lá for num momento de fome... piorou! Já reparam no corredor polonês de consumo na fila do caixa?! Você nem estava pensando nisso, mas de repente, quando vai ver, já está abraçando um pacote de salgadinho, um tablete de chocolate, um de chiclete e ainda espia a manchete da revista de fofoca. Pra completar, pega uma escova de dente, um creme hidratante e pilhas palito. Um perigo para o bolso de qualquer um!



- Amor, o sal acabou, corre lá no mercado rapidinho pra miiiiiiim?!


- Só pra isso?!


- (olhos do Gato de Botas do Shrek)


- Tá bom...


(uma hora depois)


- Que demora, amor!


- Pois é, a fila do crediário estava enorme!


- Você comprou um pacote de sal em quantas vezes?


- 24!


- VOCÊ PARCELOU NO CREDIÁRIO UM PACOTE DE SAL????


- Isso! Aproveitei que parcelei o home theater e incluí o sal!




Isso já aconteceu com vocês?! Comigo já!



*juro por Deus que não sou desse tempo

**parece piada, mas não é!

***leia-se: gigantescas equipes de marketing!

2 comentários:

Valéria Melo Cazetta disse...

Reflexão ótima. Estou tratando de consumismo com meus alunos. Posso usar o texto em sala de aula? Claro que com os devidos créditos.
Abraço!
Valéria

Unknown disse...

Pode, sim, Valéria! Será uma honra!
Mande um e-mail para mim: fabicatarse@yahoo.com.br

Faço palestras sobre comportamento do consumidor infantil. Caso interesse, podemos conversar sobre isso.

Bj!