domingo, 3 de junho de 2012

A tentativa de suicídio

- Se ele não voltar, eu juro que me mato!

Esse foi o grito que se ouviu vindo daquela casa de muros baixos no tranquilo bairro de uma pacata cidade do interior.

Não demorou e metade da cidade estava em frente à casa. A outra metade estava cuidando da própria vida.

Algum tempo depois, chegou polícia, bombeiros e a imprensa - o jornal local; um repórter da rádio regional e uma equipe da emissora de TV, afiliada de uma grande emissora da capital (que garatiria a história e, dependendo do final, poderia ganhar espaço no telejornal da emissora mãe... uma grande oportunidade... e por isso a equipe torcia pelo melhor... na concepção deles!).

De quando em quando ela repetia: "Se ele não voltar, eu juro que me mato!". Então, todos lá fora reagiam com eufóricos pedidos de "Calma! Vai dar tudo certo!" - todos, menos o pessoal da TV.

Quando chegaram ali, a confusão já estava instalada, então, o que de fato acontecera era quase um mistério. Isso porque cada um contava uma versão. O que dificultava muito o trabalho da imprensa que se empenhava em montar a linha do tempo dos fatos. Até que uma senhorinha, vizinha de muro, disse que foi ela quem chamou a polícia. Ela, portanto, sabia como tudo começara:

- Eu estava estendendo umas roupas quando ouvi ela muito nervosa discutindo com o marido. Pelo que pude entender, ele se apaixonou por outra e a talzinha pegou barriga e por isso ele estava deixando ela, a oficial, para ficar com a filial. Enquanto ele arrumava as malas, ela dizia que ele não podia fazer isso com ela, que ela amava ele, que ela não podia viver sem ele, que ela ia morrer se ele fosse, então disse que ia se matar se ele fosse. E ele foi. Daí vi que ela foi pra cozinha... daí me preocupei de verdade porque a cozinha é lugar muito perigoso para quem está com planos de dar cabo da própria vida, sabe?! Então, de casa mesmo eu gritei para ela não fazer nenhuma besteira. Ela então disse que ele ia voltar de qualquer maneira! Então eu disse que ela era muito linda, muito nova, que ia encontrar outro marido. Mas ela não queria saber de conselho, não! Queria era aquele marido mesmo. Então a vi abrir a geladeira... pegou... ai, meu Deus, nem posso me lembrar - disse trêmula - daí eu corri pra dentro de casa e liguei pra polícia. Não ia esperar o pior acontecer...

Ouviu-se um barulho. Era o liquidificador funcionando. Todos prestaram atenção.

A senhorinha se deseperou:

- Ela vai fazer...

O pessoal da imprensa tentava descobrir mais alguma coisa com a senhorinha: o que ela viu a moça pegar? Será que ela prepararia um coquetel com desinfetante, sabão em pó e soda cáustica?! Mas era inútil, a senhorinha estava descomposta.

Mais um anúncio:

- Se ele não voltar, eu juro que me mato! Eu vou beber isso... - disse a moça colocando meio corpo para fora pela janela da cozinha e empunhando um copo cujo conteúdo tinha um aspecto leitoso, meio amarelado.

Todos especulavam sobre o conteúdo, mas de fato ninguém imaginava o que havia lá dentro. E não havia mais tempo para especulação. A polícia, que até então tentava, sem sucesso, encontrar o marido fujão, não podia mais esperar: "Vamos invadir!" - diga-se de passagem, dizer essa frase era o sonho de infância do capitão que conduzia as negociações... sempre assistia àqueles filmes americanos de negociação e desde que entrou para a polícia, há 27 anos, sonhava com o dia que iria viver seu dia de John McClane (o Bruce Willis) de "Duro de Matar", seu herói!

Rapidamente, o capitão confabulou com sua equipe, ou melhor, o único soldado que o acompanhara na empreitada - o outro ficou cuidando do único preso na cadeia. O plano estava feito: um a distrairia, conversando mais de perto, enquanto o outro entraria pela porta da sala. E assim se fez. Ação rápida e eficiente - morram de inveja Swat! - enquanto o soldado conversava com ela, o capitão a tamava de assalto, tirando-lhe, certeiramente, o copo com a substância assassina desconhecida de suas mãos.

Aplausos, choros e tudo que uma ação bem sucessida tem direito. Incluindo as declarações à imprensa. Antes de entrar na ambulância que levaria a moça, em choque, para o posto de saúde da cidade, a jornalista da TV foi direta na pergunta:

- O que tinha no copo?

A moça, então, ainda desacorsoada com seu insucesso, aos prantos respondeu:

- Leite com manga.

Isso mata? A senhorinha garantia que sim.

5 comentários:

Sara disse...

Adorei! Ri muito!

Cristina Camilo disse...

Ontem, pesquisando no google sobre Ouro Preto caí no teu blog! Eu e meu marido rimos muito com seus textos! Você escreve muito bem!

Unknown disse...

Sarita!!! Obrigada!!!!

Nalini, agora que aprendeu o caminho... volta sempre, ok?!

Beijocas, meninas!

Anônimo disse...

Huahuahuahua... no comments!

Anônimo disse...

Auhauhauhauha e num mata não? Consigo até escutar a história como se você mesma a contasse... "Oralidade S2 you"