domingo, 4 de setembro de 2011

Frangaria do Ex-Goleiro




Desde menininho ele sonhava com os campos. Na verdade, embarcou no sonho do pai que a partir do instante que soube que seria pai de um menino decretou: 'vou ser pai de um craque!'. Assim que começou a entender minimamente a vida ele, o menino, percebeu que o fato de todo Natal e aniversário ser presenteado com uma bola de futebol significava alguma coisa.




Mal começou a dar os primeiros passos, o menino foi matriculado numa escolinha de futebol. Lá, passou alguns anos como gandula, até que conseguisse chutar a bola e não ser chutado por ela. A pedido do pai, sempre se oferecia para compor o ataque, muito embora aquela não parecia ser sua posição de maior talento.




Dois ou três meses tentando encontrar o caminho do gol e nada. Nenhum golzinho. O menino não era, definitivamente, um finalizador. O técnico, muito amigo do pai, resolveu recuar o garoto colocando-o como centro-avante, quem sabe seu talento fosse a criação! Hummm... também não. Criar, criar mesmo o menino só criava confusão ao passar todas as bolas para os jogadores do outro time. O técnico então o posicionou na lateral direita... depois esquerda... mas o caso é que todas as bolas fugiam dos pés do menino e passavam reto pela lateral. Quem sabe se recuá-lo mais um pouquinho? Lá foi o menino ocupar a zaga. Em vão, nem para chutar as canelas dos amiguinhos o menino servia! Tinha a bola roubada até pelos companheiros de time. Já que o guri era tão ruim com os pés, quem sabe com as mãos fosse melhorzinho. Virou goleiro.




O restante do time adorou a ideia. Não porque o menino fosse bom goleiro, muito pelo contrário, parecia até que o rapazinho (nesse tempo já era um rapazinho) untava as luvas com manteiga antes dos jogos, mas lá parecia que ele atrapalhava menos os outros 10 jogadores. Funcionava como um incentivo pra bola não sair do ataque porque se passasse pelo meio- campo, pela zaga... xiiiii, certeza que era gol feito. Assim, se havia um contra-ataque, imediatamente todos os 10 jogadores viravam zagueiros para tentar defender seu gol.




Os anos foram passando e, graças às boas relações do pai, o menino conseguiu uma vaga no 'Furiosos Futebol Clube', time de várzea do bairro. Goleiro titular, graças à saída do outro goleiro que arrumou emprego fixo em outra cidade. Para o pai, um sinal dos céus de que aquela era a chance para seu filho mostrar que era craque!




Não houve muito tempo para treinos, afinal, sabe como é time de várzea, né?! Todo mundo tem que ter um emprego por fora para se manter. O próximo fim de semana já era de jogo decisivo. O FFC estava na final do disputadíssimo campenato entre bairros. Até ali havia ganhado 79 das 80 partidas (quem disse que o Brasileirão é o campenato mais longo do país?!), a única partida que não ganhou, empatou em 0 x 0, ou seja, não tomou nenhum gol! O outro goleiro era uma muralha! Pena que além de bom goleiro, era ótimo pedreiro e acabou indo erguer paredes numa obra gigantesca.




Finalmente, dia do jogo. As arquibancadas do campinho de terra estavam abarrotadas. Além dos torcedores do FFC, torcidas dos outros times foram assistir ao jogo daquele que prometia ser o primeiro time de várzea a disputar, em alguns anos, uma Libertadores!




O rapaz, que já era um mocinho, era pura adrenalina! Seu primeiro jogo em um time de verdade... ou quase isso. O pai não cabia em si. Cegueta para a realidade, parecia que seu filho era o próprio Casillas, goleiro craque de verdade da Fúria, seleção espanhola.




Apiiiiiiita seu Luizinho, farmacéutico do bairro E juiz de várzea. Início de jogo. Bom, o que se seguiu foi um show... de horrores, para o FFC, porque o outro time... esse foi à forra! Não que o outro time fosse tão bom, mas é que, infelizmente, apenas naquele momento descobriu-se que o único jogador bom do time era o goleiro, o que saiu do time! O pai parou de contar no 27º gol que o filho tomou. Cada um pior do que o outro. Cada frango...




Uma goleada histórica de 36x0! O rapaz, que foi demitido ainda no vestiário (na verdade, o quintal da casa da dona Zefa), entendeu que, talvez, futebol não fosse seu talento. Os sinais ficaram meio que claros naquele momento. Decidiu que, mesmo fazendo seu pai infeliz, daria outro rumo a sua vida. Aquilo devia significar alguma coisa, afinal.




Um ano depois, o rapaz inaugurava seu próprio negócio: a FRANGARIA DO EX-GOLEIRO. Aproveitou a fama que ganhara naquele fatídigo jogo (e que perdura até hoje) em seu favor! Montou um pequeno restaurante cuja especialidade era frango. Eram nada menos do que 36 tipos de frango! Um sucesso. Seu talento, afinal, era a cozinha! Ali, podia jogar em todas as posições, sem chances de fazer feio em qualquer uma delas: um craque! Na semana que vem inaugura a 8ª filial e faz planos para transformar a FEG em franquia.




O pai, bom, embora tenha levado um tempo para se recuperar, hoje está mais conformadinho e sente-se muito orgulhoso por ter ajudado o filho a encontrar seu verdadeiro talento. De uma maneira meio torta, isso tem lá seu fundo de verdade!

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